Antigos moradores relembram o começo da urbanização da Barra

Werneck se mudou em 1979, convencido pelos filhos - Rodrigo Berthone
RIO — Em 1979, o professor Mauro Werneck, hoje coms 81 anos, foi voto vencido dentro de casa. Com três filhos apaixonados pela praia da Barra da Tijuca, não foi fácil para ele resistir à ideia de se mudar para o bairro — ainda pouco habitado na época, mas bastante procurado nos fins de semana para veraneio.
Ele conta que seu prédio, de seis andares, localizado próximo ao Posto 6 da Avenida Lucio Costa, era um dos mais altos da orla naquele tempo, e um dos primeiros a ter gás encanado.
Segundo Werneck, se localizar no bairro, às vezes, era bem complicado. — Aqui era um grande areal. Não tinha saneamento, e, quando ventava um pouco mais forte, acabava a luz.
Os serviços de manutenção da prefeitura não chegavam aqui. Era como morar fora do Rio estando dentro do Rio. Muitas ruas ainda nem tinham nome, eram identificadas apenas por letras.
A Avenida Adilson Serôa da Motta era apenas Rua S. A Avenida Salvador Allende tinha o nome de Via 9 — conta. O aposentado se lembra do dia em que leu no jornal, no fim da década de 1980, a manchete que anunciava a instalação dos primeiros “sinais luminosos” da Barra. 
— A Avenida das Américas era como uma estrada. Havia muito atropelamentos — conta Werneck, que foi deputado estadual nos anos 1960. De acordo com ele, foram muitas as mudanças positivas observadas no decorrer dos anos, como as transformações da Lucio Costa, que tinha apenas um sentido, fiação aérea e postes mais baixos.
Mas ele sente falta da vida pacata e lamenta a degradação da fauna e da flora exuberantes. — As lagoas eram um paraíso, mas jogaram muito esgoto nelas. O sistema de saneamento da Barra sempre foi e continua sendo muito deficiente — lamenta.
 A orla da Barra, no início dos anos 1970: área de veraneio para os cariocas - Arquivo - 2-1-1972
No início da década de 1970, outro morador antigo da região, o engenheiro Sylvio Queiroz, começou a acreditar no potencial imobiliário da ainda selvagem Barra da Tijuca. Logo começou a erguer um dos primeiros prédios do bairro, no loteamento Tijucamar.
O projeto, aprovado pela antiga Superintendência de Desenvolvimento da Barra da Tijuca (Sudebar), levou três anos para ser concluído por sua construtora. Em 1976, época em que começaram as surgir os grandes condomínios da Barra, ele deixou o Flamengo rumo ao bairro, com a mulher e os três filhos.
— Mesmo com a Barra mais desenvolvida, tínhamos receio de vir para cá. A verdade é que ninguém gostava da Barra. Todos achavam muito longe. Quando meus sogros vinham da Zona Sul nos visitar, ficavam para dormir.
Era como se fossem para Petrópolis — conta o engenheiro. Anos mais tarde, em 1982, Queiroz se mudou com a família para o condomínio Novo Leblon. Na década de 1980, diz, apenas 30% do residencial eram ocupados, sobretudo por famílias vindas das zonas Norte e Oeste.
— Na época, era o último condomínio da Barra; em direção ao Recreio, havia só terra e mato. A iluminação era muito precária, e não tínhamos nem varredura de ruas nem sistema de transporte da prefeitura — detalha. Os índices de criminalidade, conta, eram pequenos.
— Quando eu me mudei para o Novo Leblon, estava tão ansioso que nem esperei a casa ficar totalmente pronta. A casa ficava toda aberta, ainda estava sem muro e janelas, e não tive problema — relembra.
Montanhas e submarinos  Antes de se mudar, José e Eliana iam namorar na Barra - Rodrigo Berthone
A primeira vez em que o engenheiro civil José Cidade avistou a Barra da Tijuca foi do alto, em meio às nuvens. O ano era 1967, e o então jovem de 22 anos atuava como cadete aviador da antiga Escola da Aeronáutica — posteriormente denominada Academia da Força Aérea.
Na época, segundo ele, a Barra se limitava a uma pista de grama no Aeroporto de Jacarepaguá e a algumas poucas casas construídas onde hoje se encontra a Avenida Erico Verissimo.
Ele recorda que o referencial para os pilotos era a Pedra da Gávea, e as manobras de retorno eram sempre realizadas sob o Jardim Oceânico. Encantado com a paisagem de praias e montanhas, o jovem cadete pensou grande, e, quase que como numa profecia, lá do alto, disse para si mesmo:
“É aqui que eu quero morar”. Com a ajuda do destino (e de um judeu que precisava se desfazer de seus bens na cidade), ele conseguiu, 18 anos depois, em 1985, adquirir seu primeiro apartamento na Barra, na Rua Zaco Paraná, bem embaixo do local onde realizava manobras. — Quando chegamos aqui, muitas ruas nem asfaltadas eram, e era preciso fazer tudo de carro ou a pé.
Para comprar pão perto de casa, só tinha uma padaria. Se ela estivesse fechada, o jeito era ir no dia anterior ao Carrefour — relembra. Para ele, a tranquilidade do bairro era um diferencial. — A gente podia sair a qualquer hora sem medo de violência — diz o engenheiro, que atualmente mora na Rua General Ivan Raposo e tem uma belíssima vista da Pedra da Gávea.
Na década de 1980, quando o bairro ainda não era tão cobiçado por quem procurava apartamentos para morar, a Barra servia como um oásis vizinho à cidade grande. — As pessoas vinham para cá como iam a um passeio, uma excursão.
Nessa época, existiam poucos mas excelentes restaurantes, como o Tarantela (na área do Pepê), o Sapore di Sale e o Palhota, além da boate Flamingo (antiga Corsário), que atraía gente da cidade toda — relembra a pedagoga Eliana Regina, mulher de Cidade. 
O casal frequentava o Churros del Uruguay na Praça do Ó - Arquivo Pessoal / Foto Um dos programas preferidos do casal era comer churros.
Gostavam de comprá-los de um uruguaio cujo caminhão ficava parado na Praça do Ó. — O Churros del Uruguay era muito conhecido. O caminhão ficava a a uns 30 metros do nosso apartamento, e tinha fila. Na época, a praça ainda tinha poucos prédios — conta o marido.
Embora tenham se tornado moradores da Barra apenas em 1985, os dois frequentavam o bairro desde os anos 1970, quando namoravam.
Na maioria das vezes, os passeios tinham como objetivo ver uma tal “corrida de submarino”, expressão usada na época quando um rapaz convidava uma moça para namorar dentro do carro, à beira-mar. — Todo mundo vinha namorar aqui — diverte-se Eliana, que continua apaixonada pelo bairro.
— Mesmo com todos os problemas de hoje, como a violência, este é o meu lugar preferido. Tem tudo de que eu gosto, como a praia e shoppings grandes e confortáveis. Só saio daqui morta, de preferência, bronzeada.
Werneck se mudou em 1979, convencido pelos filhos - Rodrigo Berthone
RIO — Em 1979, o professor Mauro Werneck, hoje coms 81 anos, foi voto vencido dentro de casa. Com três filhos apaixonados pela praia da Barra da Tijuca, não foi fácil para ele resistir à ideia de se mudar para o bairro — ainda pouco habitado na época, mas bastante procurado nos fins de semana para veraneio.
Ele conta que seu prédio, de seis andares, localizado próximo ao Posto 6 da Avenida Lucio Costa, era um dos mais altos da orla naquele tempo, e um dos primeiros a ter gás encanado.
Segundo Werneck, se localizar no bairro, às vezes, era bem complicado. — Aqui era um grande areal. Não tinha saneamento, e, quando ventava um pouco mais forte, acabava a luz.
Os serviços de manutenção da prefeitura não chegavam aqui. Era como morar fora do Rio estando dentro do Rio. Muitas ruas ainda nem tinham nome, eram identificadas apenas por letras.
A Avenida Adilson Serôa da Motta era apenas Rua S. A Avenida Salvador Allende tinha o nome de Via 9 — conta. O aposentado se lembra do dia em que leu no jornal, no fim da década de 1980, a manchete que anunciava a instalação dos primeiros “sinais luminosos” da Barra. 
— A Avenida das Américas era como uma estrada. Havia muito atropelamentos — conta Werneck, que foi deputado estadual nos anos 1960. De acordo com ele, foram muitas as mudanças positivas observadas no decorrer dos anos, como as transformações da Lucio Costa, que tinha apenas um sentido, fiação aérea e postes mais baixos.
Mas ele sente falta da vida pacata e lamenta a degradação da fauna e da flora exuberantes. — As lagoas eram um paraíso, mas jogaram muito esgoto nelas. O sistema de saneamento da Barra sempre foi e continua sendo muito deficiente — lamenta.
 A orla da Barra, no início dos anos 1970: área de veraneio para os cariocas - Arquivo - 2-1-1972
No início da década de 1970, outro morador antigo da região, o engenheiro Sylvio Queiroz, começou a acreditar no potencial imobiliário da ainda selvagem Barra da Tijuca. Logo começou a erguer um dos primeiros prédios do bairro, no loteamento Tijucamar.
O projeto, aprovado pela antiga Superintendência de Desenvolvimento da Barra da Tijuca (Sudebar), levou três anos para ser concluído por sua construtora. Em 1976, época em que começaram as surgir os grandes condomínios da Barra, ele deixou o Flamengo rumo ao bairro, com a mulher e os três filhos.
— Mesmo com a Barra mais desenvolvida, tínhamos receio de vir para cá. A verdade é que ninguém gostava da Barra. Todos achavam muito longe. Quando meus sogros vinham da Zona Sul nos visitar, ficavam para dormir.
Era como se fossem para Petrópolis — conta o engenheiro. Anos mais tarde, em 1982, Queiroz se mudou com a família para o condomínio Novo Leblon. Na década de 1980, diz, apenas 30% do residencial eram ocupados, sobretudo por famílias vindas das zonas Norte e Oeste.
— Na época, era o último condomínio da Barra; em direção ao Recreio, havia só terra e mato. A iluminação era muito precária, e não tínhamos nem varredura de ruas nem sistema de transporte da prefeitura — detalha. Os índices de criminalidade, conta, eram pequenos.
— Quando eu me mudei para o Novo Leblon, estava tão ansioso que nem esperei a casa ficar totalmente pronta. A casa ficava toda aberta, ainda estava sem muro e janelas, e não tive problema — relembra.
Montanhas e submarinos  Antes de se mudar, José e Eliana iam namorar na Barra - Rodrigo Berthone
A primeira vez em que o engenheiro civil José Cidade avistou a Barra da Tijuca foi do alto, em meio às nuvens. O ano era 1967, e o então jovem de 22 anos atuava como cadete aviador da antiga Escola da Aeronáutica — posteriormente denominada Academia da Força Aérea.
Na época, segundo ele, a Barra se limitava a uma pista de grama no Aeroporto de Jacarepaguá e a algumas poucas casas construídas onde hoje se encontra a Avenida Erico Verissimo.
Ele recorda que o referencial para os pilotos era a Pedra da Gávea, e as manobras de retorno eram sempre realizadas sob o Jardim Oceânico. Encantado com a paisagem de praias e montanhas, o jovem cadete pensou grande, e, quase que como numa profecia, lá do alto, disse para si mesmo:
“É aqui que eu quero morar”. Com a ajuda do destino (e de um judeu que precisava se desfazer de seus bens na cidade), ele conseguiu, 18 anos depois, em 1985, adquirir seu primeiro apartamento na Barra, na Rua Zaco Paraná, bem embaixo do local onde realizava manobras. — Quando chegamos aqui, muitas ruas nem asfaltadas eram, e era preciso fazer tudo de carro ou a pé.
Para comprar pão perto de casa, só tinha uma padaria. Se ela estivesse fechada, o jeito era ir no dia anterior ao Carrefour — relembra. Para ele, a tranquilidade do bairro era um diferencial. — A gente podia sair a qualquer hora sem medo de violência — diz o engenheiro, que atualmente mora na Rua General Ivan Raposo e tem uma belíssima vista da Pedra da Gávea.
Na década de 1980, quando o bairro ainda não era tão cobiçado por quem procurava apartamentos para morar, a Barra servia como um oásis vizinho à cidade grande. — As pessoas vinham para cá como iam a um passeio, uma excursão.
Nessa época, existiam poucos mas excelentes restaurantes, como o Tarantela (na área do Pepê), o Sapore di Sale e o Palhota, além da boate Flamingo (antiga Corsário), que atraía gente da cidade toda — relembra a pedagoga Eliana Regina, mulher de Cidade. 
O casal frequentava o Churros del Uruguay na Praça do Ó - Arquivo Pessoal / Foto Um dos programas preferidos do casal era comer churros.
Gostavam de comprá-los de um uruguaio cujo caminhão ficava parado na Praça do Ó. — O Churros del Uruguay era muito conhecido. O caminhão ficava a a uns 30 metros do nosso apartamento, e tinha fila. Na época, a praça ainda tinha poucos prédios — conta o marido.
Embora tenham se tornado moradores da Barra apenas em 1985, os dois frequentavam o bairro desde os anos 1970, quando namoravam.
Na maioria das vezes, os passeios tinham como objetivo ver uma tal “corrida de submarino”, expressão usada na época quando um rapaz convidava uma moça para namorar dentro do carro, à beira-mar. — Todo mundo vinha namorar aqui — diverte-se Eliana, que continua apaixonada pelo bairro.
— Mesmo com todos os problemas de hoje, como a violência, este é o meu lugar preferido. Tem tudo de que eu gosto, como a praia e shoppings grandes e confortáveis. Só saio daqui morta, de preferência, bronzeada.