Projeto cria regras mais duras para aplicativos de transporte no Rio


Uber: Projeto de Lei Complementar na Câmara do Rio prevê limitar número de veículos de aplicativos de transporte em circulação no Rio - Aquivo / 07/06/2018 

RIO — Faltando 20 dias para e eleição, dez comissões da Câmara de Vereadores deram, em uma só tacada, o parecer favorável a um polêmico Projeto de Lei Complementar (PLC) que estabelece regras mais rígidas para o funcionamento dos aplicativos de transportes, como Uber, Cabify e 99 — e agora o texto está pronto para ser votado em plenário.
De autoria dos presidente da Casa, Jorge Felippe (MDB), e de Vera Lins (PP), o novo projeto prevê que o total de veículos ofertados por todos os aplicativos ocorra na proporção de um carro para cada 750 habitantes segundo o último censo do IBGE, o que atualmente permitiria 8.427 veículos de aplicativos em circulação no município. Embora Felippe garanta que o PLC só entrará na pauta após a eleição, a iniciativa vai favorecer os taxistas do municiípio. A coautora do projeto, Vera Lins, reconheceu que "é eleitoreira".
Ao GLOBO, a vereadora Vera Lins afirmou que entrou como coautora no projeto porque as reinvindicações da categoria sempre interessam a ela e ao seu marido, o deputado estadual Dionísio Lins (PP), assim como ao presidente da Câmara, que tomou a iniciativa do projeto. Para ela, o parecer conjunto das dez comissões que considera o projeto constuticional ocorreu pela facilidade com que Jorge Felippe transita entre os outros vereadores, nas palavras da parlamentar.
— A gente está à beira de eleições, uma eleição difícil. Os taxistas estão quase sangrando com os aplicativos, é muito carro na rua. Como eles estão num desespero muito grande, têm sempre esperança de que a coisa melhore — afirma a vereadora Vera Lins (PP), que confirma o tom eleitoral da proposta:
— Parece não, é eleitoreiro.
Segundo a Secretaria municipal de Transportes, há cerca de 32 mil táxis cadastrados na cidade.
PRESIDENTE DA CÂMARA NEGA
Já Jorge Felippe nega que a proposta tenha ligação com a eleição deste ano. Ele garante que o projeto não será votado antes do pleito e que passará por audiências públicas na Câmara. Para Felippe, o setor de aplicativos de transporte na cidade, atualmente, é uma "caixa-preta".
— Não será votado antes da eleição. Não tem nada a ver com a questão eleitoral. Vai ser precedido de audiência pública para se discutir essa situação do trânsito e da mobilidade urbana da cidade do Rio. Aqui no Rio é uma bagunça. Não tem mais hora de rush, qualquer hora está engarrafado — diz o vereador, que ainda critica a regulamentação realizada em abril pelo prefeito Marcelo Crivella.
— O projeto regulamenta (o serviço), porque hoje está regulamentado de forma muito liberal. Hoje, não tem limite e ninguém sabe quantos são os veículos de aplicativos. Se você olhar as placas, mais de 60% desses carros são de outros municípios que trabalham no Rio. Mas o taxista não pode sair do Rio pra trabalhar em Niterói.
DEZ LEIS SOBRE TÁXIS APROVADAS
Jorge Felippe Neto, neto de Jorge Felippe, é candidato à reeleição na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). Na Câmara, o avô apresenta dez leis aprovadas em favor dos taxistas. Entre elas, está a Lei Complementar 159/2015, que regulamenta a profissão de taxista; a Lei Complementar 18/1992, que estabelece o número máximo de permissões de táxi à proporção de um veículo para cada 500 habitantes do município; e a Lei Ordinária 4878/2008, que define 25 de julho como Dia do Taxista.
Além de Felippe, Vera Lins aparece como coautora do Projeto de Lei Complementar. Ela e seu marido têm atividade parlamentar ligada aos representantes de taxistas. A vereadora, por exemplo, apresentou em março deste ano o Projeto de Lei 757/2018, que permite aos membros da categoria circularem nas faixas exclusivas do BRT quando estiverem a trabalho. Também foi dela o projeto de lei, aprovado na Câmara em 2016, que proibía o uso de aplicativos de transporte com carros particulares. Enquanto isso, na Alerj, Dionísio Lins é autor da Lei 7936, que considera patrimônio histórico e cultural do estado os táxis comuns, conhecidos como "amarelinhos". Dionísio Lins é vice-presidente da comissão de transportes da Alerj.
Além do limite de veículos, outro ponto polêmico em tramitação na Câmara atualmente é o fim dos preços dinâmicos (quando o valor da corrido é mais caro devido ao aumento da procura) e que os motoristas paguem mensalmente a quantia de R$ 148,23 à Secretaria municipal de Transportes. O valor corresponde à Taxa de Fiscalização Itinerante, para ajudar a pasta na fiscalização pelos agentes públicos.
No dia 12 de abril, o prefeito Marcelo Crivella publicou um decreto que regulamenta o setor. Na ocasião, o município determinou que as operadoras de aplicativos continuam tendo liberdade para fixar os valores das corridas. O decreto não fixou um limite para o número de motoristas, mas estebeleceu uma taxa de 1% em cima de cada corrida.
UBER DIZ QUE PROPOSTA É 'ARBITRÁRIA'
O GLOBO pediu, por meio das assessorias de imprensa, um posicionamento do prefeito Marcelo Crivella e da secretária municipal de Transportes do Rio, Virgínia Maria Salerno, a respeito das propostas do novo projeto. Em nota, a prefeitura informou que respeita a independência entre os Poderes e disse que só vai se manifestar caso ele seja aprovado.
Já a Uber, em nota, afirmou que a proposta é "arbitrária" e não resulta em melhorias efetivas no serviço. "Pelo contrário: tirariam essa fonte de renda de dezenas de milhares de motoristas parceiros da Uber no Rio, oneraria os perceiros com taxas abusivas e deixaria o serviço mais caro e escasso para a população, prejudicando especialmente moradores da região metropolitana do Rio", afirmou a empresa em nota. Ainda de acordo com a companhia, a Uber defende "regulações modernas e justas, que usam a tecnologia para o bem das pessoas e das cidades. Esse projeto de lei vai na contramão disso e pode, da noite para o dia, reverter um caminho de progresso que havia sido traçado com o decreto assinado pela Prefeitura do Rio no último mês de abril".
Os representantes da 99 destacaram que o projeto vai no sentido contrário de decisões tomadas outras capitais, como Fortaleza, Porto Alegre, São Paulo e Vitória. "Hoje, 70% das corridas de 99Pop começam ou terminam fora do quarto mais rico da cidade. E 25% das corridas começam ou terminam em estações de metrô, de BRT ou das barcas", afirmaram em nota. "Passageiros serão estimulados a voltar a usar o carro próprio, ocupando mais espaços nas ruas e mais vagas de estacionamentos", acrescentaram eles, que acreditam que a limitação vai criar "uma sobreposição de oferta nas regiões centrais da cidade". O fenômeno seria ruim até para os próprios taxistas, que poderiam ver "um aumento da concorrência".
A Cabify afirmou que o projeto de lei é uma "proibição velada aos apps":
"A Cabify acredita que a Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro ameaça a mobilidade urbana carioca, a renda de milhares de brasileiros e todo o diálogo construído em torno do Decreto nº 44.399/201 aprovado em abril deste ano. O legislativo carioca concedeu parecer favorável a um Projeto de Lei Complementar (PLC) arbitrário, sem dialogar com a sociedade civil e o setor da mobilidade, o resultado é uma proibição velada aos apps. A empresa reforça ainda a falta de transparência e a rápida aprovação do texto em todas as Comissões Temáticas sem o devido e amplo debate democrático. Essas e outras limitações restringem a oferta do serviço e comprometem a renda de diversos profissionais e suas famílias, que ficariam proibidos de prestar o serviço em um momento de crise econômica. O texto aprovado também viola os princípios constitucionais da livre concorrência, livre iniciativa e é uma regulação expropriatória, pois eleva o custo tributário de forma desmedida.
É importante ressaltar que, de acordo com o Marco Civil da internet, as empresas têm o dever de garantir a segurança dos dados dos usuários e motoristas parceiros. Assim, é uma determinação federal que a Prefeitura do Rio de Janeiro proporcione e garanta um ambiente seguro para qualquer tipo de compartilhamento de informações. Da mesma forma, a obrigação de a empresa conceder acesso ao seu sistema pode configurar uma violação a direitos de propriedade intelectual.

A empresa reforça que acredita que a regulamentação do transporte individual privado de passageiros é, além de legítima, necessária para garantir o bom equilíbrio da concorrência. Por isso, a empresa procura manter constante diálogo com o Poder Público em todas as localidades em que atua, sempre buscando uma regulamentação equilibrada para todos os envolvidos neste ciclo: municípios, população, motoristas parceiros e empresas de aplicativo.
A Cabify espera que os vereadores cariocas ouçam a voz de milhares de motoristas e usuários e rejeite o referido projeto que inviabiliza a atividade no município. O texto poderá impactar negativamente a vida de diversos motoristas, que perderão sua oportunidade de renda, e dos usuários, que deixarão de ter uma alternativa de locomoção, se o projeto for aprovado da forma em que se encontra".
CONFIRA: NOVE PONTOS POLÊMICOS DO PROJETO
1) Limite na quantidade de motoristas: limita a apenas 8.427 motoristas parceiros a autorização para prestar o serviço na cidade.
2) Residência obrigatória na cidade do Rio: somente motoristas residentes no município do Rio de Janeiro serão autorizados a prestar o serviço, excluindo todos aqueles que têm residência em cidades da região metropolitana, como Niterói, Duque de Caxias, Nova Iguaçu, Belford Roxo, entre outras.
3) Idade veicular: para ingressar no sistema, os veículos deverão ter no máximo 4 anos de fabricação e poderão permanecer cadastrados até no máximo 6 anos de fabricação. "Isso vai impedir que cerca de 78% dos veículos da plataforma continuem circulando, afirma a Uber.
4) Proibição de carros tipo hatch: somente poderão prestar o serviço veículos do tipo sedan ou perua.
5) Placa vermelha e emplacamento no Rio: exige que os veículos cadastrados no sistema tenham seu registro modificado para a categoria aluguel junto ao Detran, que requer o uso de placa vermelha. "Essa foi uma das exigências derrubadas na Lei Federal 13.640/2018 e, portanto, é inconstitucional", questiona a Uber. Além disso, somente veículos emplacados no município do Rio de Janeiro poderão ser cadastrados.
6) Fim do preço dinâmico: proíbe o sistema de preço dinâmico, utilizado para estimular a oferta de motoristas em casos de alta demanda de usuários em determinadas horas e locais.
7) Tributação dos motoristas: os motoristas precisarão pagar uma taxa mensal adicional de R$ 148,23 para a Secretaria de Transportes, o que equivale a R$ 1.778,76 por ano. As empresas de aplicativos também seriam obrigadas a reter na fonte 5% dos ganhos dos motoristas para efeitos de pagamento do ISS prestado pelo serviço de transporte. Além do ISS e da taxa, a lista total de impostos retidos é extensa: contribuições previdenciárias, imposto de renda, SEST – Serviço Social do Transporte/SENAT – Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte, PIS – Programa de Integração Social/COFINS – Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social e os demais tributos referentes à natureza do serviço de transporte.
8) Pontos de embarque: proíbe a fixação de pontos de embarque e desembarque, assim como quiosque e lounges, em áreas públicas e privadas e em eventos, tais como shows, aeroportos, shoppings e outros. A lei ainda prevê multa de R$ 5 mil para os motoristas.
9) Cobrança extra de 5% por quilômetro rodado: o preço de cada viagem será também acrescido de, no mínimo, 5% sobre cada quilômetro rodado, "uma taxa pública que deixará as viagens mais caras e será repassada integralmente à Prefeitura", afirma o Uber.

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